Ab aeterno

As minhas boas vindas a todos os que por aqui passarem. Espero que apreciem o que vos dou aqui. Os desenhos, as fotografias e os textos que publico são da minha autoria (caso não sejam eu mencionarei).

Usufruam.


sábado, 12 de dezembro de 2009

É Natal




Os sinos rasgam o silêncio da estação coma sua prece de ingratidão. Anunciam uma época festiva cujo sentido é hoje desconhecido. Os sinos tocam e o eco retumba na ausência do coração do Homem. O menino Jesus chega num embrulho de ouro anunciado por uma estrela da mais alta tecnologia. O Pai Natal vem em primeira classe num avião sofisticado enquanto os seus duendes morrem num esforço sofrido em terras áridas, em fábricas desumanas para servir os caprichosos e egoístas.

As renas já não passam de pele, esfoladas pelo Pai Natal em natais passados, servem apenas de sacola para presentes de luxúria. Mas a culpa não é do homem vestido de vermelho. A culpa é dos pedidos, escritos criteriosamente na essência corrompida do Homem que não se cansa de ansiar pela soberba, que não deixa de desejar o mundo aos seus pés.

As Igrejas enchem-se à meia-noite das vésperas de Natal, todavia, o canto do galo é efémero. Prega-se a solidariedade e o amor mas as pessoas saem a correr para viver a inveja e o ódio. Ora-se por aqueles que nada têm mas as pessoas saem a correr para comprar trabalho infantil e mão-de-obra explorada. Reza-se para que não se ceda ao hedonismo e aos materialismos, mas as pessoas saem a correr para consumir os prazeres imediatos e palpáveis.

Enchem-se as mesas com gula enquanto as crianças desembrulham presentes com rótulos de alta qualidade mas sem conteúdos de amor. Elas riem, agradecem sem saber (mas um dia saberão) que os únicos laços que aquelas prendas possuem são os exteriores, que facilmente se rasgam com um puxar de mão. Os pais sorriem em resposta porque sentem que compensaram o amor que não dão, o tempo que não têm, a relação que nunca edificarão.

Todos são felizes na época de Natal, a época dos efeitos coloridos abundantes que tentam esconder a pobreza, a fome, a morte, a doença na qual a maior parte do mundo celebra a época. Enquanto uns esbanjam dinheiro pelas algibeiras outros rastejam em busca de uma única moeda que lhes renda um pedaço de pão.

Ligamos a televisão e ouvimos: “Neste Natal seja solidário”, “Neste Natal faça o seu contributo”. E aqui surge a interrogação: porque não ouvimos todos os dias na caixinha mágica com igual clamor vozes que dizem seja solidário hoje? Talvez não passe de mais uma tentativa de encobrir o consumismo que é o Natal: já que gasta tanto dinheiro em inutilidades, tenha o mínimo de decência e dê uns tostões aos pobrezinhos.

Qual o simbolismo natalício actualmente? Um consumo inútil, desenfreado. Uma estória bonita corrompida. Porque agora o Pai Natal já não é o mito do imaginário de uma criança: o velho simples das barbas imaculadas com a sua sacola de alegria que galopa os céus com as suas belas renas. O Pai Natal agora veste Prada, é patrocinado pela Coca-Cola e trás consigo um cachecol e umas luvas na Coco Channel. As renas não passam de cabedal da melhor qualidade num saco que já não transporta caridade, união, família, felicidade, mas antes LCD’s, playstations e portáteis da Apple. Por isso as crianças já não sonham e o Natal não é Natal. E por isso o repicar dos sinos anuncia uma época de solidão disfarçada. E as estrelas do céu que profetizam paz, saúde e alegria morrem a cada dia, porque são cada vez menos as crianças, que afinal são o destino do mundo, que acreditam na essência do Natal.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Aprender



Não consigo.

Quero a escuridão.

Torrentes de emoção,

Indecifráveis.

Não quero decifrar,

Chorar,

Quero afastar demónios de capítulos incompreendidos,

De banais trivialidades.

Queria compreender,

O amor.

Queria compreender a luz

Queria compreender um mundo,

Mas não consigo ficar,

Não consigo abarcar esta miríade de sensações.

Não peço um olhar,

Não aspiro as ligeirezas de um romance,

Não exijo alegria.

O que eu quero é o silêncio da noite,

A quietude do negrume

Sem sombras de ilusão.

Do que eu preciso é de uma mão

Dada na escuridão

Preciso dessa mão

Para compreender o sofrimento.